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Partidos políticos nacionais?

No ano eleitoral surge sempre a pergunta: Os partidos políticos são nacionais? A pergunta é motivada pela perplexidade que invade o eleitor, medianamente informado, em face das esdrúxulas coligações partidárias nos Estados e Municípios. Não é incomum se vê um ou mais dos trinta e cinco partidos registrados no Tribunal Superior Eleitoral se coligarem em um Estado e se colocarem como adversários em outro. Essas coligações e disputas, contrariando até o programa ideológico/partidário, também ocorrem com frequência nos municípios de um mesmo Estado. Essa anomalia política, ideológica e eleitoral ocorre até mesmo em Diretórios Municipais e Estaduais, contrariando, as mais das vezes, a orientação da Direção Nacional do Partido. Essa distorção do sistema partidário brasileiro chega ao cúmulo de um governador, Senador, Deputado ou Prefeito se posicionar contrário ao Presidente ou governador eleito pelo seu partido político, apoiar um adversário e na campanha eleitoral se coligar com partidos adversários e de oposição em nível estadual e nacional. Um absurdo.

Desde a década de 1940 do século passado que os partidos políticos passaram a ter caráter nacional, extinguindo-se definitivamente o sistema de partidos estaduais que existia no Brasil e ainda existe em outros países, inclusive no Estados Unidos da América (apesar das eleições lá serem disputadas basicamente pelos candidatos dos partidos nacionais Republicano e Democrata e uma outra candidatura avulsa).

A Constituição Brasileira de 1988, no seu artigo 17, inciso I, não deixa qualquer dúvida sobre o caráter nacional dos partidos políticos, ao dispor: “É livre a criação, fusão, incorporação e extinção dos partidos políticos, resguardada a soberania nacional, o regime democrático, o pluripartidarismo, os direitos fundamentais da pessoa humana e os observados os seguintes princípios: I – Caráter nacional”.  No mesmo sentido a Lei nº 9.096, de 19 de setembro de 1995, que regulamenta a criação dos partidos políticos, praticamente reproduz o artigo 17, inciso I da Constituição Federal e acrescenta no seu artigo 5º que a “ação do partido tem caráter nacional e é exercida de acordo com o seu estatuto e programa, sem subordinação a entidade ou governos estrangeiros”.

Ora, se o partido político, por determinação constitucional e legal tem caráter nacional e a sua ação deve ser realizada com esse desiderato e de acordo com o seu estatuto e programa partidários, evidente que não podem as instâncias estaduais e municipais contrariarem a orientação nacional, quanto à sua ação e coligação com outros partidos, sob pena de vulnerar inapelavelmente o comando constitucional contido no artigo 17, inciso I e ferir de morte o preceito legal inserto no artigo 5º da Lei nº 9.069/95, bem como seu princípio basilar democrático e republicano de partido político nacional.

Em sendo assim, ouso afirmar que no Brasil, conquanto a Constituição e a lei de regência dos partidos políticos determinem que têm caráter nacional e devem agir nacionalmente coesos e com base em seus programas, estatutos e orientação da direção nacional, na prática o que se observa é a incoerência ideológica, programática e estatutária; o desrespeito à orientação e estratégia político/eleitoral do diretório central, a desobediência e independência das instâncias estaduais e municipais, que fazem coligações estapafúrdias e inaceitáveis, embora essas questões, a meu ver, devam ser resolvidas interna corporis , vez que se trata de pessoa jurídica de direito privado (artigo 17, § 1º da CF e artigo 1º da Lei nº 9.096/95), pode-se recorrer, excepcionalmente, à Justiça Comum e dependendo do caso à Justiça Eleitoral, cabendo, todavia,  ao eleitor a palavra final, para através do voto, repudiar essas práticas não republicanas.

 

Bartolomeu Bueno
Desembargador do Tribunal de Justiça de Pernambuco
Presidente da Associação Nacional dos Desembargadores